terça-feira, 28 de outubro de 2014

Críticas pós-comemoração

O ambiente que me cercou durante todo o segundo turno foi de amor e ódio.

Virtual e presencialmente, foram poucos os argumentos críticos em ambos os lados.

Entendo que criticar sua própria opção, em uma eleição, é dar tiro no pé, mas acho que passado o pleito, é hora de fazer algumas considerações sobre minha escolha.

Acho que não precisaria repetir isso, mas escolhi Dilma sem pestanejar, principalmente pela atmosfera ideológica e simbólica que foi criada ao longo do processo.

Já falei aqui que não considero o PT um partido radical, e que está longe de ser a guinada à esquerda que eu gostaria de ver, mas os contornos do segundo turno não me deixaram qualquer margem de dúvida.

O que não significa que eu esteja totalmente de acordo com o que aconteceu nos últimos quatro anos, muito menos com as propostas elencadas para esse novo mandato.

Em relação ao que foi feito anteriormente, não apenas no primeiro governo da Dilma, mas também nos governos Lula, são dois os pilares que sustentaram o meu voto, e imagino que o de muitas outras pessoas também.

O primeiro, mais visível e difundido ao longo da campanha, foram os programas sociais de diminuição da pobreza e redução das desigualdades internas pelo Brasil, ainda que meus conterrâneos paulistas insistam em demonizá-los e em derramar seu ódio e preconceito contra os beneficiados – que em muitos casos estão por aqui mesmo.

O segundo, considerado como menos importante, mas que pessoalmente vejo como fundamental, é a orientação da política externa, cada vez menos voltada para os EUA e para a Europa (mas sem cortar relações) e cada vez mais soberana e aberta ao diálogo com o Terceiro Mundo – os BRICS, a Unasul, a Celac, a relação com a África.

Vale uma menção, também, à abertura de diversas universidades federais pelo Brasil todo, além do incentivo à entrada nas universidades particulares através do Prouni, que se não é o ideal por estimular a privatização da educação, a curto prazo tem seus benefícios.

Esses avanços, porém, não impedem que eu identifique alguns pontos que não tem recebido tratamento crítico pelos eleitores da Dilma, como se as melhorias indicadas acima anulassem outras questões não tão bem resolvidas.

Em primeiro lugar, é de coçar a cabeças as alianças que os governos petistas foram fazendo com partidos conservadores e com grandes empresas, que se por um lado facilitam as ações políticas por outro desvirtuam paulatinamente os ideais não apenas do partido, mas de todos seus eleitores.

Nesse aspecto, infelizmente a nova composição do congresso e o financiamento da campanha presidencial não me deixam muito otimista quanto a mudanças.

A construção da usina de Belo Monte e a transposição do rio São Francisco também não podem ser tratadas acriticamente, já que mexem diretamente com as populações afetadas e com a questão ambiental, e estão longe de ser unanimidade.

Reconheço que não tenho argumentos suficientes para dizer se essas obras são necessárias ou aberrações, mas pelo que tenho ouvido de muitos profissionais e pesquisadores da área, elas são, pra dizer o mínimo, pelo menos discutíveis.

Da mesma maneira, tenho ouvido cada vez mais críticas de pessoas ligadas aos movimentos sociais, núcleo histórico de eleitores do PT, de que muito pouco foi feito em relação à reforma agrária e à habitação urbana, sendo que intervenções pontuais e oportunas precisam ser a exceção, e não a regra.

Por último, não se pode esquecer o sufocamento das manifestações durante a Copa, que se não foi uma exclusividade do governo federal, teve seu aval.

Em relação ao novo mandato que começa ano que vem, algumas pautas me parecem fundamentais.

Uma delas, lembrada pela presidenta em seu discurso da vitória, é a reforma política.

Concordo que o financiamento das campanhas precisa ser revisto, mas acho que essa reforma não pode se reduzir apenas a isso.

Posso estar profundamente enganado, mas esse sistema de participação política onde nós apenas votamos de 2 em 2 anos em alguém para nos representar não parece mais suficiente.

Não sei se o caminho são os plebiscitos, se são assembléias populares, mas tenho pra mim que novos mecanismos de participação política precisam ser criados.

Uma segunda questão, fundamental e dificílima de ser colocada em pauta, ainda mais com o congresso que se formou, é a questão da regulação da mídia.

Tenho ouvido muitos questionamentos sobre a liberdade de expressão e de imprensa, mas ninguém parece se preocupar com o fato de que a concessão de canais de televisão e emissoras de rádio é extremamente monopolizada.

O monopólio da informação, e o impedimento de novas vozes se expressarem publicamente, com a criminalização das rádios comunitárias por exemplo, não me parece ser exatamente liberdade de expressão.

Liberdade e monopólio não são palavras que se misturam.

Por fim, eu gostaria apenas de um posicionamento claro em relação à descriminalização das drogas, aos direitos LGBT e à questão do aborto, de preferência um posicionamento bem distante do conservadorismo que vem se apossando do Brasil ultimamente.

Espero que os eleitores da Dilma entendam esse texto como uma crítica no sentido positivo da palavra.

Eu, como eles, também votei na presidenta, e não foi aquele tal voto “triste”, mas um voto firme e consciente.

Queria, com ele, deixar claro que não podemos esperar pelo candidato ideal, pois ele não existe.

Nosso sistema político nos obriga a escolher entre algumas opções.

Cabe a nós refletir sobre a que achamos melhor para nossas aspirações.

Para mim, foi Dilma. 

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Lá e cá














Antes de qualquer coisa, é necessário dizer que minha última visita a Moçambique foi há 5 anos atrás.

Mais do que isso, totalizei apenas 1 ano e meio de estadia por lá, o que não é pouco enquanto intercâmbio, mas é certamente insuficiente para compreender a realidade política de um país.

Assim, por mais que, desde então, eu não tenha parado de acompanhar, mesmo que de muito longe, as notícias moçambicanas, é óbvio que não tenho muita autoridade pra falar do assunto das eleições deste 15 de outubro de 2014.

De qualquer maneira, como aqui no Brasil também passamos por um momento eleitoral, resolvi fazer um exercício comparativo das eleições nos dois países, inegavelmente mais próximos do que nunca por causa de Vales, Odebrechts, Embrapas e acordos bilaterais.

Existem hoje, em Moçambique três candidatos à presidência de três partidos diferentes.

O grande favorito, até onde pude apurar, é Filipe Nyusi, da Frelimo, que representa a continuidade do partido que está no poder desde 1975, muito por causa do papel que a Frelimo teve na luta de libertação nacional.

Partido aparentemente de esquerda, responsável por implantar o regime socialista por alguns anos no país, o que ouvi e tenho ouvido da Frelimo desde 2008 é que, além de ser também o responsável pela entrada de Moçambique no projeto neo-liberal (e as consequentes concessões e privatizações), os próprios dirigentes do partido são os empresários que comandam essa empreitada (entre eles o atual presidente, Armando Guebuza).

Mesmo assim, Filipe Nyusi apresenta-se como a mudança.

Sei que pode parecer imprudente o que vou falar, mas de certa forma vejo semelhanças (simbólicas, obviamente) da candidatura de Filipe Nyusi com a de Dilma Rousseff aqui no Brasil: continuidade do partido de esquerda no poder - sob o slogan da mudança -, e com acusações tanto de esquerdistas radicais, que o consideram parceiros íntimos do capital, quanto da oposição, devido às suspeitas de corrupção.

Também de maneira especulativa, imagino que a segunda força das eleições presidenciais moçambicanas é Afonso Dhlakama, da Renamo.

Da mesma maneira que não é consenso que o PSDB representa a direita no Brasil, eu não afirmaria com todas as letras que a Renamo é a direita moçambicana, mas historicamente ela é a grande força de oposição da Frelimo.

Igualmente ao PSDB no Brasil, porém, a Renamo dos tempos da independência representava (não sei se ainda representa) os interesses estadunidenses e britânicos no país, em oposição à orientação socialista da Frelimo.

Não conheço o projeto de governo de Dhlakama e da Renamo, mas é meio claro pra mim que, simbolicamente, sua candidatura equivale à oposição histórica ao partido no poder, aos mesmos moldes que aqui no Brasil.

A minha grande comparação com o Brasil, contudo, e que me fez pensar esse texto, está na terceira candidatura à presidência moçambicana, de Daviz Simango, do partido MDM.

Em 2009, como resultado da histórica polarização (conhece o termo?) entre Frelimo e Renamo, foi criado em Moçambique o MDM – Movimento Democrático Moçambicano -, e que representaria uma terceira via aos dois partidos principais.

Pouco a pouco, muitos moçambicanos aceitaram a proposta, e sobre a dualidade existente desde a independência surgiu uma nova força política.

Mais uma vez quero afirmar que não pretendo comparar as propostas e o que representa Daviz Simango em Moçambique e o estranho fenômeno Marina Silva no Brasil, mas acho válido destacar esse movimento comum nos dois países.

Obviamente que os processos históricos – principalmente a duração dos ciclos -, são muito diferentes nos dois países, mas achei a comparação da situação política interessante.

Uma esquerda questionada, ambígua e presente no poder a algum tempo, uma oposição historicamente forte e associada à mudança e aos interesses ocidentais, e a ascensão de uma terceira via cada vez mais representativa.

Importante dizer, se aqui no Brasil já manifestei meu apoio à Dilma, em Moçambique não sou muito afeito à Frelimo, e admito não saber nada sobre Nyusi.


Mas as clivagens políticas em ambos os países, com sentidos muito parecidos, parecem escancarar as consequências de uma história comum marcada pelo colonialismo e pela desigualdade interna.

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

A política externa e o segundo turno












Ainda que o clima de xenofobia e falta de respeito instaurado com o segundo turno das eleições presidenciais tornem isso perigoso, inicio meu texto afirmando que já fiz minha escolha para a disputa.

Não foi minha escolha para o primeiro turno, mas o faria sem problema nenhum.

Votei, no domingo passado, na Luciana Genro, entendendo que uma guinada mais radical à esquerda se fazia necessária, e também por simpatia aos posicionamentos da candidata em diversos temas, mas tinha consciência de que não seria um voto vitorioso.

Assim, e apesar de saber que muitos eleitores do PSOL não pensam como eu, votei nela certo de que no segundo turno votaria para a reeleição da presidenta Dilma.

Nesse momento provavelmente muitos já estão inquietos, reunindo argumentos para contestar minha escolha e talvez até elaborando xingamentos que se enquadrem nas minhas características pessoais.

Infelizmente, a disputa à presidência mais uma vez caiu no velho embate entre PT e PSBD, levando consigo tudo que essa disputa contém.

O pessoal do centro-sul, como sempre, destila seu ódio sobre os que consideram vagabundos e incapazes de pensar, pelo fato exclusivo de não votar como eles e de ousarem participar da escolha do futuro do país que, pasmem, é de ambos.

Em ambos os lados da disputa, o maior esforço empreendido pelos eleitores é o de atacar e desmerecer o adversário, usando e abusando de retornos ao passado e informações duvidosas que supostamente tiram qualquer possibilidade de legitimidade do outro.

Quero deixar claro, mais uma vez, que não pretendo ser imparcial, e afirmo novamente que votarei e prefiro a Dilma do que o Aécio e as idéias do seu partido, mas reconheço que esses mecanismos de ataque são usados dos dois lados (e admito que é muito tentador usá-los, no que tenho tentado evitar).

Essa prática violenta, apesar de útil eleitoralmente, tira o foco das propostas que cada candidato tem para o país, que apesar de estarem disponíveis na internet, são praticamente inacessíveis ao eleitorado, seja por condições técnicas, seja por falta de tempo de ler tudo aquilo.

Contudo, talvez pela minha formação em Geografia, tenho especial interesse na questão da política externa, e apesar de saber que não é a única, nem mesmo a mais importante de todas para o país, pessoalmente considero fundamental para fazer minha escolha.

E nesse ponto considero a opção por Aécio um retrocesso sem tamanho.

Não faltam possibilidades de crítica aos governos Lula e Dilma, mas na questão das relações exteriores, não tenho dúvidas de que o avanço foi do nível “nunca antes na história desse país”.

Ainda que não tenha sido o rompimento que eu desejava, a diminuição da dependência dos EUA e da Europa são de se comemorar, mas o que mais me animou foi a aproximação com os países da América Latina e da África e, mais recentemente, o fortalecimento da relação com os BRICS.

Me parece meio claro que a hegemonia ocidental está em franca decadência, e não precisa ser nenhum especialista para entender que a China já se consolidou como uma nova candidata à liderança.

Essa liderança, porém, nos tempos de hoje é necessariamente compartilhada, multi-polar, e as alianças com a Rússia, Brasil, Índia e África do Sul são consideradas fundamentais para os chineses.

Aliado com esses países, integrado com a América Latina e dialogando com a África, o Brasil parece caminhar, se não para a desejada autonomia, para uma melhor condição de inserção no sistema mundial, principalmente no Terceiro Mundo.

Tenho para mim que a saída não está em olhar para o Norte, que pouco a pouco perde seu encanto e é, inclusive, gradualmente tomado pelos imigrantes dos países que há pouco tempo explorava sem dó.

Mas Aécio Neves não pensa assim.

Ele insiste em se reaproximar dos EUA e da Europa, e tudo leva a crer que todo o esforço em prol de uma união entre as Américas, a África e a Ásia, vai ser engavetada novamente, pelo menos por essas bandas.

E é por isso, mas não apenas, que voto em Dilma.

Espero que minha reflexão tenha contribuído um pouco para o debate acerca do segundo turno, tentei pensar nas propostas e possibilidades que os candidatos têm para um determinado assunto, mas sem perder de vista que estava me posicionando claramente.

Gostaria que o debate fosse ampliado, mas se possível sem ofensas e desqualificações.

Certamente tenho vontade de fazê-lo também, mas penso que, mesmo que a duras penas, o controle é importante.

E a discussão de idéias passa por ele.