segunda-feira, 31 de março de 2014

O legado da Copa



Não faltam argumentos anti-Copa.
As obras milionárias.
E insuficientes.
Os elefantes-brancos.
Estádios e hospitais.
O caos no trânsito.
Desvio de dinheiro.
Imposições da FIFA.
Dentro disso tudo, qual seria o legado da Copa?
Tenho uma impressão.
A Copa já deixou um legado.
Antes mesmo de começar.
Ela despertou o Brasil.
O gigante adormecido.
Não o gigante econômico.
Da frieza dos números.
O gigante da truculência.
Do preconceito.
Da violência.
O Brasil latente.
Perdão.
De latente não tinha nada.
Era bem real.
O mundo que não via.
E o próprio Brasil tentava não ver.
Mas aflorou tanto que apareceu.
Começou na Copa das Confederações.
A Copa das Manifestações.
A Copa colocou o Brasil na vitrine.
E resolvemos nos mostrar.
A polícia bateu.
Proibiram entrar no shopping.
Amarraram no poste.
Arrastaram pela rua.
Pediram a volta dos militares.
Estupraram e justificaram.
Na ânsia de construir um novo Brasil para a Copa.
Nos deparamos com um antigo muito bem construído.
Através da caça ao índio.
Da pilhagem colonial.
Da escravidão.
Da dívida externa.
Da ditadura.
A Copa é só mais um passo.
Mais uma sujeição ao exterior.
Como todas as outras.
Mas que, pela visibilidade, potencializou o Brasil.
Não pro mundo.
Pra nós mesmos.
Espero que sirva pra alguma coisa.
Já que mexeu nas feridas.
Já que fez jorrar o sangue.
Que ajude a fazer o curativo.
A Copa chegou.
E esse é o seu legado.

sexta-feira, 28 de março de 2014

Transição ou Ruptura?



Há quem diga que a história é cíclica.
Há quem diga que é um processo contínuo.
Em ambos os casos, reconhece-se a existência de períodos.
Períodos que começam, chegam ao seu auge, e terminam.
Começam, pois o período anterior não funciona mais.
Ou não agrada mais.
Geralmente ambos.
E terminam pelo mesmo motivo.
De tempos em tempos, a mudança é necessária.
É sempre melhor para uns, pior para outros.
Mas é necessária.
Saudável, eu diria.
A grande questão é como mudar.
Transição ou ruptura.
No Brasil, hoje, fala-se muito em ruptura.
Em todos os discursos.
Nos discursos anti-governo, ruptura total com o PT.
Com seus programas e diretrizes.
Chega-se, até, a pedir a volta da ditadura.
Nos discursos anti-capitalismo, ruptura total com o sistema.
Nada de Estados Unidos, de mercado e de finanças.
Romper, de uma hora pra outra, com essa trama antiqüíssima.
A ruptura é tentadora.
Ainda mais quando a insatisfação com a ordem atual é extrema.
A idéia de mudar tudo, começar do zero, parece a melhor.
Se livrar dos vícios.
Colocar em prática tudo que consideramos certo.
Derrubar, enfim, tudo que foi construído ao longo do tempo.
E que dá base para o mundo em que vivemos.
Pra bem ou pra mal.
A maior dificuldade, porém, é sustentar a mudança.
Permitam-me uma frase senso comum.
Mas é mais fácil destruir do que construir.
O que fazer depois da demolição?
Como sustentar esse projeto de mudança por longo tempo?
E por isso sou defensor da transição.
Fazer uma transição não é, para mim, se render à ordem vigente.
É contrariá-la.
É reafirmar que ela não é mais possível.
É construir uma nova ordem a partir dela.
Afinal, a crítica à ordem vigente nasce dela mesma.
Mais do que isso, a transição fornece tempo.
Tempo para pensar a mudança.
Tempo para se adaptar à mudança.
Tempo para comunicar aos outros a mudança.
Tempo para vivenciar a mudança.
E ver se ela é realmente mudança.
Ou se precisa de um novo contorno.
Sempre fui um especialista em rupturas.
Todas tiveram conseqüências intensas.
Novamente, pra bem ou pra mal.
Algumas vezes, porém, fiz transições.
E as consequências foram sempre mais saudáveis.
Não necessariamente no resultado final.
No que consegui ou deixei de conseguir.
Mas nas respostas que dei a mim mesmo durante o processo.
E na forma como encarei o resultado.
Mudar é necessário.
Tempo para mudar, mais ainda.

sexta-feira, 7 de março de 2014

Navegando em águas turvas


Tenho um pé atrás com textos de internet.
Principalmente as notícias.
Infelizmente, notícia virou sinônimo de fato.
Como se fato existisse.
Como se não fosse uma interpretação da realidade.
Um discurso.
E discursos não são imparciais.
São feitos por alguém.
Pode ser uma pessoa.
Pode ser uma instituição.
Que, a propósito, é composta por pessoas.
Com opiniões próprias.
E tendências a uma ou outra visão de mundo.
Não falo isso apenas das grandes mídias.
A Globo, a Folha, a Veja.
Vale também pra mídia independente.
O discurso geralmente é outro.
E geralmente me atrai muito mais.
Mas são, fundamentalmente, discursos.
E isso às vezes confunde.
Pelo menos a mim.
A Ucrânia, por exemplo.
Li algumas coisas sobre o que está acontecendo lá.
E a maioria delas, faz sentido.
Com algumas eu simpatizo, com outras nem tanto.
Mas, dentro de sua lógica de pensamento, são coerentes.
Apesar de desmentirem umas às outras.
E aí mora o problema.
Nunca saberei o que realmente acontece lá.
Porque não estou lá.
Tudo que sei sobre o assunto, é por intermediação.
Alguém viu de perto.
Alguém estudou.
Alguém escreveu.
Alguém direcionou.
Alguém opinou.
E eu apenas recebi.
Não fiz nada além de receber a informação.
E a partir dela, criei a minha própria opinião.
Parcial e tendenciosa.
Se bem que no caso da Ucrânia não consegui montar uma.
Mas isso não vem ao caso.
O importante aqui é saber que são todos discursos.
E nem por isso deixam de ser verdade.
Verdade pra quem escreveu.
Verdade pra quem entendeu.
Por isso tenho um pé atrás com textos de internet.
Cada um que cultive suas verdades.
Sem perder de vista que são apenas discursos.
E não verdades absolutas.