segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

O tiki-taka e a aceleração contemporânea











Sou daqueles que acredita que o futebol, dentro de campo, é um pouco espelho da sociedade em que se insere.

Não estou dizendo com isso que os jogadores brasileiros são naturalmente mais malandros, e os europeus mais durões, o que é verdade apenas em parte.

O ponto onde quero chegar é que a forma de se jogar o jogo é inspirada no espírito da época - o tal do zeitgeist.

Assim, a “revolução futebolística” do carrossel holandês da década de 70, dos jogadores sem posição e independentes, refletia um pouco a juventude de um período de criatividade e liberdade, não apenas na Holanda mas em todo o mundo.

Mais ou menos nessa linha, toda a história do futebol soviético, enquanto existiu, tinha aquele ar de futebol coletivo e operário, pragmático, onde não existiam astros e individualidades, e que de certa forma incomodava o resto do mundo.

Não vou nem falar da Democracia Corintiana da década de 80 pra não encher a bola deles – mas fica a menção.

A seleção espanhola já não assusta mais como nos últimos anos, mas o conceito do tiki-taka invadiu o mundo, clamando por um futebol rápido e com trocas de passes à exaustão, onde não se pode mais segurar a bola, apenas passá-la.

Minha intenção não é argumentar que esse futebol é feio e não funciona, porque a Alemanha foi campeã do mundo ano passado jogando assim, e de vez em quando surgem bons jogos nesse estilo, como o jogo da própria Alemanha contra a Argélia na Copa passada.

Mas essa idéia de futebol acelerado, com a bola circulando sem parar, só poderia ter sido criada no período atual, onde tudo (de bom e de ruim) acontece com uma velocidade frenética, e onde é mais importante colocar as coisas em movimento do que entendê-las.

O futebol do tiki-taka não perdoa os lentos, os que pensam devagar e os que não são fisicamente exemplares.

Jogar bem, hoje, é jogar rápido.

Alguma semelhança com nossa sociedade contemporânea?

Sinceramente, e apesar de não ter vivenciado a época, gosto de ver as jogadas do futebol dos anos 80, bem mais lento do que o nosso, mas que parecia encantar mais.

Acho incrível, por outro lado, a capacidade de resistência de um jogador como o Danilo, que mesmo com essa obsessão pelo futebol rápido consegue, a passos lentos, ditar o ritmo dos jogos e ser decisivo em todo lugar que passou.

É claro que gosto de ver um contra-ataque veloz, ou um golaço numa troca de passes rápida, mas no geral prefiro ver um jogo cadenciado, mais tranqüilo, do que passar o jogo inteiro sem conseguir respirar ou tomar um gole de cerveja.

Espero, de coração, que essa moda do futebol frenético seja passageira.

Que seja rápida que nem seu conceito.

Porque de frenético já basta o cotidiano.


O futebol não merece isso.

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